quinta-feira, julho 06, 2006

Eles não sabem que o sonho...



"Eles não sabem que o sonho é uma constante da vida, tão concreta e definida como outra coisa qualquer". Começo com este excerto do poema de António Gedeão para, de alguma forma, resumir a eliminação da selecção portuguesa do mundial de futebol na Alemanha.

Desde cedo percebi que esta participação portuguesa no mundial tinha muitos oponentes em relação às escolhas de Scolari, como também à sua capacidade. Após este facto iniciamos a campanha com uma vitória, como o resultado final a ser o de um a zero, com a selecção Angolana. Vieram os primeiros apupos: que a selecção pode dar muito mais, que fazem falta aqueles que Scolari não elegeu, que isto e que aquilo. Resumo: a vitória ficou em segundo plano.

Seguiu-se o jogo com o Irão. Conclusão quase idêntica à anterior, com o senão de ter sido dito que Portugal não fez mais que a sua obrigação, ganhar.

Com o apuramento já garantido, no jogo com o México, e com uma equipa diferente daquela que alinhou nas partidas anteriores, jogamos vinte minutos de delicioso futebol, vencemos, mas mesmo assim não convencemos aqueles que de adeptos de selecção tem pouco. Estes escondiam-se atrás de um lacónico "agora e que o campeonato vai começar".

E de facto começou. Começou o campeonato das dores de cabeça daqueles que foram, são e continuaram a ser contra Scolari, isto porque vencemos os holandeses com um golo de Maniche, uma das escolhas mais criticadas por estes e que de alguma forma veio obrigar estes profetas da desgraça a camuflarem o seu desejo e sede de derrota, esquecendo, sempre, que para lá do seleccionador está a equipa portuguesa e quase toda uma nação.

Seguiu-se a Inglaterra, jogo maior que converteu quase todos os detractores em fervorosos adeptos de Portugal, apesar de por dentro fervilharem em água de cozedura pronta a acolher Scolari ou alguma das suas escolhas estes agora congratulavam-se com a magnífica exibição de, espante-se, Ricardo. O guarda-redes que foi um dos bodes expiatórios da derrota portuguesa na final de 2004, foi nesta altura a tábua de salvação dos detractores, essa com pregos que faziam derramar o sangue que denunciava a falta de apoio destes à selecção, forma claramente verificável num expressivo " o teu Ricardo lá safou aquilo", alusão ao facto de eu ser adepto sportinguista. Apesar do brilhante desempenho da nossa selecção em duas provas seguidas a clubite continua a povoar as mesquinhas mentes dos fanáticos do futebol, que mesmo quando lhes fazemos ver que não existe um "meu Ricardo" mas, sim um "NOSSO Ricardo" a resposta é um "naaa".

Chegamos então ao jogo com a França, às meias finas do campeonato do mundo depois de tal feito apenas ter sido conseguido alcançar em 1966!, e o jogo acaba por não correr bem a Portugal. Ricardo, esteve bem, seguro, apesar de não ter muito trabalho tem uma defesa decisiva, com alguma sorte, na segunda parte. Fernando Meira, esteve bem, seguindo a linha daquilo que apresentou ao longo da competição. Ricardo Carvalho, o homem do penalty, não conseguiu evitar o contacto com Henry, apesar da sua enorme categoria e experiência. Acaba por ser admoestado com amarelo em outro lance que o coloca fora do próximo jogo, que infelizmente não é a final. Nuno Valente, também cumpriu, não acompanhou muito o ataque pois os extremos franceses criavam grande perigo, contudo, bem a defender. Miguel, tentou apoiar o ataque, teve duas ou três iniciativas interessantes, na melhor acaba por se atirar para o chão após tabelar com Pauleta. Saiu lesionado. Para o seu lugar entrou Paulo Ferreira, nada fez que seja digno de nota. Costinha, esteve discreto, como sempre, mas desta vez muito por culpa do resultado desde cedo favorável à França que pouca ou nenhuma função este podia desempenhar em campo que visa-se o desequilíbrio. Maniche, começou bem mas veio aos poucos a perder fulgor, não criou espaços, poucas diagonais, e muito desacompanhado por Deco. Já este, Deco, esteve mal, muito mal, pouco imaginativo, não criou os movimentos de rutura necessários à equipa e com isso sofrem, directamente, jogadores como Maniche ou Pauleta. Figo fica na história do jogo com o lance do cabeceamento por cima da trave após livre de Cristiano Ronaldo e defesa incompleta de Barthez. Cristiano Ronaldo, foi o mais inconformado durante toda a partida, lutou, driblou, rematou, enfim, fez tudo para levar a equipa para a frente. Não o conseguiu. Pauleta, foi uma vez mais ineficaz na frente de ataque, muito desapoiado, as bolas que lhe chegavam vinham de Ricardo, e nesta situação específica este não tem características que lhe permitam consolidar o seu desempenho. Simão e Postiga, passaram pelo jogo sem grande destaque.

Olhamos para esta exibição da selecção como a menos conseguida durante a competição, a fraca ligação entre sectores fez-se sentir de forma fracturante na equipa Portuguesa, o mau jogo de Deco é difícilmente compensado por alguém naquela zona do terreno, o lance da penalidade em jeito de flashback é atroz na forma como psicologicamente derrota todos os jogadores, a não existência de uma referência no ataque é uma lacuna de anos na selecção.

E aqui que nasce a discussão, na actuação de Pauleta. Para mim este não é o avançado que a selecção necessita, como não o são Postiga ou Nuno Gomes. Acho que Pauleta é, de longe, o melhor avançado português, infelizmente também o é , de longe, o menos eficaz em fases finais das grandes competições, para tal comparamo-lo com os avançados das outras três equipas ainda em prova. Não vamos dissecar esta comparação sobre pena de autoflagelação.

Neste cenário de derrota e da já célebre forma de arranjar alguém para ser o bode expiatório da derrota, vem à cabeça o supracitado Scolari e Pauleta.

A corja de abutres que paira sobre a selecção desde a final de Lisboa, chegou ontem a andar de cachecol e de bandeira até ao final do jogo, mas assim que ele acabou exultaram de raiva contra Scolari e Pauleta esquecendo todo o percurso da selecção e avançando para estes como se de carne putrefacta se tratassem.

A muitos deles tentei avançar com a simples explicação para a sua "clubite" e falta de apoio à selecção, que apenas tem a ver com a falta de uma cultura de vitória e de bom desempenho da equipa Portuguesa. Falei-lhes do hóquei em patins e atletismo, como forma de elucidar aquilo que uma nação gosta de ver a apoiar, a selecção. Mas estes não querem saber disso, acham que, em matéria futebolistica, existem sempre culpados, existem sempre más opções que resultam em derrotas, existem sempre contras a tudo sobretudo na selecção. E nisso eu lhes dou, alguma razão pelo passado. Agora eles esquecem-se que nisto de futebol existe sempre futebol, ou seja, a incerteza quanto ao desempenho de um jogador, a decisão do árbitro, a sorte e o azar, todos estes factores fazem parte de um desporto que todos ama-mos, mas alguns fazem-no de forma irracional. Estranho é que nesta forma irracional de pensar o futebol, estes não se dediquem ao espaço onírico do mesmo deixando de lado a clubite e a irreequieta forma de culpabilizar alguem, neste caso, pelo bom desempenho da selecção que se quer de todos nós... Eles não sabem que o sonho...