quinta-feira, janeiro 26, 2006

O mea culpa da SIC no Clube de Jornalistas

Acabo agora de ver, e com grande satisfação, o mea culpa da SIC na voz de João Adelino Faria, sobre a sobreposição de discursos na passada noite de domingo.
João Adelino Faria assumiu, de forma clara, ter sido um erro retirarem do “ar” Manuel Alegre em detrimento de José Sócrates.

É importante assumir o erro que tem origem nos requintes de malvadez de Sócrates, apesar de este continuar a insistir que não sabia que Manuel Alegre tinha acabado de iniciar o seu discurso. Este facto é bastante plausível, uma vez que Alegre não está na vice-presidência da Assembleia da República, não é militante do PS, e nem é, tão pouco, o segundo candidato mais votado nas últimas eleições, à frente do candidato escolhido pelo seu partido. Por estas e outras razões acreditamos que no Largo do Rato ninguém estava a ver o que se passava nas três estações que transmitiam o discurso.

Este assunto remete, inevitavelmente, para o agendamento feito pelos media na campanha eleitoral, pois este foi e serve de exemplo, a um paradigma que esperamos que não venha a vingar entre os profissionais da área, que é o de o agendamento realizado pelos candidatos e suas “máquinas partidárias” se sobrepor ao agendamento editorial de uma redacção.

Foram vários os acontecimentos deste tipo, desde a sobreposição de discursos à forma imperativa como o modelo de debates televisivos foi construído, passando ainda pela imprensa, que teve como ponto de referência a fotografia de Mário Soares, na primeira página do Expresso, que curiosamente nessa semana tinha como novo director Henrique Monteiro. No Clube de Jornalistas foi possível ver e ouvir o autor da fotografia, António Pedro Ferreira, dizer que aquela imagem não reflecte de modo algum o verdadeiro estado de espírito de Mário Soares à altura do “boneco”, e que o próprio se sentiu desconfortável e admirado com a publicação desta na página nobre do semanário.

São estes os principais momentos que se debateram no, como sempre, excelente Clube de Jornalistas e que trazem à reflexão o tema do agendamento e suas perversões. É bom estarmos atentos a todas estas movimentações, pois como sabemos, estas derivam em sua maioria no facto de os órgãos de comunicação social estarem cada vez mais concentrados nas mãos de grandes grupos empresariais, que limitam em muito a tão desejada autonomia jornalística.

Com este cenário sinto-me tentado a pensar, e escrevo-o, que o Gatekeeping é um conceito “bipolar” quando tentamos identificar a sua presença nas nossas campanhas eleitorais.

terça-feira, janeiro 24, 2006

Um milhão e duzentos mil votos

Foi a votação obtida por Manuel Alegre. Então e agora? Pergunto eu e, de certeza, muito do seu eleitorado.

O que pretende Manuel Alegre fazer neste momento? Formar um partido? Formar um movimento cívico? Mudar linhas estratégicas de pensamento dentro do PS? Continuar na vice-presidência da Assembleia da República como se nada tivesse acontecido? Abandonar a política com uma vitória pessoal e paradoxalmente um segundo lugar a trinta pontos percentuais de Cavaco Silva?

E o seu eleitorado, o que pensa fazer caso Alegre não tome nenhuma decisão ou, simplesmente, abandone a política?

Será este mais um movimento de cidadãos parecido ao que deu votos e vitória tanto a Isaltino Morais como a Fátima Felgueiras?

Estas e outras questões, talvez, venham a ter resposta. Vamos alegremente esperar por elas.

Adeus congresso até depois

Soube-se, hoje, que o congresso do PS previsto para breve e que certamente abordaria o tema presidencial e suas consequências, afinal, já não existirá.

Dois dias depois de ter interrompido o discurso de Manuel Alegre, José Sócrates “eclipsa” agora o congresso em prol de uma provável reunião da comissão política nacional.Para chegar a este consenso Sócrates apoia-se sobretudo na máxima “unir e reforçar” a liderança e, segurar Manuel Alegre na vice-presidência da Assembleia da República.

Sócrates mostra-se assim muito atento aos futuros desenvolvimentos, certamente, negativos que teria o seu governo se Manuel Alegre nesta altura fosse afastado. Não só no seu governo esta medida seria contraproducente, também na opinião pública e em toda a conjuntura política a mesma seria alvo de grande especulação.

É assim obrigatório estar atento a estas movimentações de Sócrates, que até agora o têm afastado a si, e ao PS, da confrontação directa com o efeito Alegre. Sócrates sabe bem do precedente que esta em vias de ser aberto devido ao desastroso resultado político obtido, e como tal, não hesita em tomar as “rédeas” deste “cavalo selvagem” que Manuel Alegre se tornou.

Resta agora saber o que Alegre fará, se vai continuar no PS cordialmente como se nada tivesse acontecido, ou se irá reclamar para si, em algum momento, um milhão e duzentos mil votos, pondo assim a descoberto a fractura partidária interna, por si criada.

segunda-feira, janeiro 23, 2006

A Predição Cavaquista

E assim se cumpriu, na noite de 22 de Janeiro de 2006, a predição cavaquista.

Dez anos depois de ter perdido para Jorge Sampaio as presidenciais, Aníbal Cavaco Silva é eleito à primeira por maioria absoluta com 50.59% dos votos.

Os factos de interesse nesta eleição começam logo pelo candidato vencedor e pelo segundo lugar atribuído a Manuel Alegre, pois ambos sempre se intitularam como sendo, no caso de Cavaco suprapartidário, em relação a Alegre, um movimento de cidadania isento de qualquer ligação partidária. Em traços gerais, os políticos foram destronados pelos “não-políticos”.

Este panorama atira irremediavelmente Mário Soares, o candidato do PS para uma derrota desnecessária, não só a nível pessoal como para uma derrota partidária, com possível fractura política interina no PS.

Por muito que a concertação a nível do discurso de Sócrates seja bastante semelhante à de Cavaco Silva, este apoiado em lugares comuns como estabilidade, rigor e esperança para Portugal, não demonstra o real sentimento de insatisfação no seio do PS.

Este facto é, claramente, visível no discurso de Sócrates, iniciado poucos segundos depois do de Manuel Alegre. Estratégias possíveis no mundo mediático em que vivemos. Segundo sei, Sócrates sabia precisamente que Alegre estava no “ar” e esse facto depressa o motivou a iniciar o seu discurso, apesar, repito, dos avisos sobre Alegre estar no “ar” serem por si ignorados.

Sócrates espera agora que Alegre volte a ocupar, pacificamente, o lugar que lhe pertence na assembleia, espera que Cavaco cumpra a sua promessa de estarmos sem eleições nos próximos três anos, e espera ainda que o próximo congresso do PS, sirva não para debater o que aconteceu na presidenciais mas sim potenciar e dar mostras ao país, mas sobretudo à oposição, que o partido não se dividiu após este conturbado período eleitoral.

Quanto a Cavaco Silva, foi igual ao que nos habituou nesta campanha, não fugindo um milímetro ao discurso por si empregue durante a mesma. Regista-se a frase “Neste exacto momento dissolve-se a maioria que me elegeu. Quero ser e serei o Presidente de todos os portugueses”.

Em relação à luta travada por Jerónimo de Sousa e Francisco Louçã, o candidato apoiado pelo PC, levou a melhor. Comparativamente às últimas eleições, não só manteve o eleitorado, de resto tradicional, como subiu um ponto percentual em relação ao último escrutínio, ponto esse que pode – especulativamente - ter sido a causa de o candidato Francisco Louçã ter tido um resultado decepcionante, perde um ponto percentual em relação ao último resultado confirmado.

No fim, fica Garcia Pereira, pouco se pode dizer em relação a este candidato, saliente-se o facto irrevogável de não ter tido direito a aparecer no espaço mediático de forma equitativa, a agenda dos media não reservou espaço para este candidato, ou melhor, nunca o interpretou como tal.


Quanto à diferença partidária entre PM e PR, uma coisa é certa, se Sócrates for bom primeiro-ministro, Cavaco Silva será bom presidente. Agora quanto à possibilidade contrária, ao primeiro deslize, a força de Cavaco vai seguramente fazer-se sentir. Mas por agora, como estes representam neste momento o centro, as coisas têm tudo para correr bem.


Como nota final, desta curta reflexão sobre as presidenciais, deixo a minha convicção de que neste momento entrámos num clima de “paz armada”, onde as movimentações a nível partidário vão ser uma constante, a começar brevemente com o congresso do PS e, inevitavelmente, pelos partidos PSD e PP, que a breve trecho serão “contaminados” pela sinergia cavaquista, que se vai apoderar principalmente do PSD. Acredito que os líderes deste dois partidos, a curto prazo, venham a ser substituídos, mas isso só o futuro nos revelará.